Telefone

Puxa vida, que coincidência! Minha tia saiu, o telefone tocou.

(HOMEM) –  Marília?

(EU)  – Ela saiu.

Aqui deveria estar "(HOMEM) – Obrigado.", e seria o fim da ligação. Mas não.

O que aconteceu foi silêncio, mesmo, da chamada sendo desligada.

Estranho, né? Pois é.

Este Homem é casado com uma Mulher. Acabei de descobrir que foram feitos um para o outro, neste aspecto: duas mulas gêmeas.

Logo depois ligou um Velho.

Atendi puto, certo de que era um dos cônjuges. Eu ia falar umas poucas e boas. Ou talvez tratar com uma melosidade irritante, para contrastar com a bestialidade deles. Talvez depois mandasse os dois irem para algum lugar muito ruim. Não sei. Ia acontecer. E já atendi pronto pra guerra:

(EU) – Airton!!!

(VELHO, falando suavmente) – Oi, bom dia… digo, boa tarde…

(EU) – Boa tarde! – respondi, agora um pouco menos irado.

(VELHO) – Por favor, dona Marília está?

Agora eu já estava apaixonado pela educação do coroa. Gente, não é difícil, são poucas palavras que fazem a diferença!

(EU) – Não, senhor, não está. Ela saiu e só volta…

Pensei se emendava com ‘vai demorar’ ou com ‘só volta na segunda, vou estar sozinho em casa até lá. Vem pra cá?’ ou com ‘está na casa da sobrinha dela. Vai lá dar umas aulas que tem gente precisando.’ Eu já confiava no velho. Se ele me perguntasse a senha do banco, diria, na hora. Eu disse:

(EU) – … Só volta segunda. O senhor quer deixar algum recado?

Na verdade eu já estava pensando em escrever isso e sabia que o nome dele ia ser importante. Agora penso, para quê citar nomes, né? A inteligência necessária para perceber de quem estou falando é mínima, acho que todo mundo que consegue andar e falar pode perceber de quem estou falando.

(VELHO) – É o Fulano, sobrinho da Fulana (uma velha aí). Eu só queria confirmar se o telefone estava certo. É que estou refazendo minha agenda telefônica, e como este telefone é muito antigo…

(EU) – Sim, entendi, e este número está certíssimo. Se o senhor quiser, durante a semana consegue falar com ela. De qualquer forma eu digo que o senhor ligou.

(VELHO) – Tá bom, muito obrigado, tá?

(EU) – Por nada, senhor, um prazer.

(VELHO) – Bom final de semana. Tchau.

(EU) – Obrigado, o mesmo. Tchau.

Sério, gente: se o cara bate aqui na porta agora, eu caso com ele! Só pela educação!

Agora, outras pessoas, se baterem na porta… Não sei como reagiria. Talvez como um igual, como um bovino, que olha pra uma pessoa, não gosta, abaixa a cabeça e continua pastando.


Duas considerações finais:

  1. eu fiquei MUITO puto com isso. Mas isso acontece pelo menos uma vez por ano desde que atendo telefone aqui em casa. Não entendo como pessoas que se acham tão superiores não conseguem alcançar o básico da educação, que é uma coisa básica; simplificando para que eles talvez entendam, não conseguem alcançar o básico do básico. Eu tenho defeitos gravíssimos, mas ver gente assim faz com que eu veja que já evoluí um pouco.
  2. A ignorância é uma benção. Parabéns, vocês são muito abençoados.

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